domingo, 17 de novembro de 2013

Doca Problemática




               Há alguns dias recebi do meu amigo Marcelo Luis Wisnsecki uma sugestão de matéria que aborde a questão de docas inadequadas aos caminhões do segmento leve (que o pessoal da estrada conhece por ¾).


               O diferencial destes veículos (além, é claro, da menor capacidade de carga, em média 8 toneladas de PBT, de Peso Bruto Total) em relação aos médios está nas rodas. Eles usam rodas de 17,5 polegadas de diâmetro, enquanto os veículos da categoria imediatamente superior (os médios) já usam rodas de 22,5 polegadas de diâmetro. Estas 5 polegadas a menos no diâmetro das rodas trazem uma diferença de altura significativa, o que os torna (em tese), inadequados para descarregar pelo sistema de docas, muito comuns nos modernos Centros de Distribuição. A menor altura dos ¾ causa um pequeno desnível na rampa de ligação entre o assoalho da carroceria (normalmente baú) e o piso da doca. Tal desnível faria com que a carga paletizada tombasse no carrinho conhecido como paleteiro e poderia ser a responsável por algum eventual dano nas mercadorias. Mas penso que cuidados simples no manuseio dos palets nessas condições podem e devem ser tomados, como por exemplo, a operação de descarga ser realizada com o acompanhamento de um auxiliar ou o paleteiro ser virado dentro do baú, de modo que ao sair, o operador ande para frente e não para trás.


               Cabe aqui uma breve contextualização acerca do parágrafo acima.

               O amigo que me sugeriu a matéria entrou recentemente para o ramo de transporte. Já é empresário bem sucedido no ramo de sonorização de eventos na cidade de Montenegro, RS e hoje é proprietário de um Volkswagen 9-160.

               Recentemente ele passou por dissabores com entregas bastante atrasadas (apesar de ter agendado horário para a descarga). Atraso de mais de 10 horas. Mas o que motivou a matéria (por isto o título) foi um sujeito num centro de distribuição que “condenou” o caminhão de Winsecki. “O seu caminhão é muito baixinho. Da próxima vez não irá mais descarregar”, disse o sujeito. Peço a gentileza do caro leitor de observar as fotos abaixo e que comente acerca das imagens e de tudo que foi aqui exposto. O próprio Winsecki depois verificou a existência de vários ¾ descarregando no mesmo CD, o que passou a imagem de uma certa implicância ou má vontade. Como se vê, a inclinação da rampa não é tão absurda assim.

Fotos: Marcelo Luis Winsecki


               O segmento dos leves deveria ser visto com um pouco mais de atenção por parte do setor logístico e das montadoras. São veículos que tendem a se popularizar por uma série de fatores: As cidades começam a criar restrições, notadamente nas regiões centrais das cidades maiores para veículos maiores. Em São Paulo, o problema é tão sério que as montadoras criaram um veículo específico para aquela região chamado VUC (Veículo Urbano de Carga). Para serem enquadrados como VUC (e portanto ter o direito de transitar em determinadas regiões), ele precisa atender às seguintes características:

a) largura máxima: 2,20m (dois metros e vinte centímetros);

b) comprimento máximo: 6,30m (seis metros e trinta centímetros);

c) limite de emissão de poluentes:os especificados para o PROCONVE L-4 ou P-5, conforme o caso e, a partir de 1º de janeiro de 2009, PROCONVE L-5 ou P-6, conforme o caso, cujos parâmetros técnicos são estabelecidos pelas alíneas "a" a "h" dos artigos 5º e 6º (PROCONVE L-4 e L-5) e Tabelas 1 e 2 do artigo 15 da Resolução CONAMA nº 315, de 29 de outubro de 2002.

               E por ser um segmento em tão franca expansão, os modelos estão ganhando capacidade de carga e motores mais potentes e com mais torque. O mais potente do segmento é o inédito Ford Cargo 1119, lançado na Fenatran 2013. É equipado com um potente motor Cummins ISB 4.5  de 4 cilindros com excelentes 189 cv e bom torque de 61,2 mkgf a 1.500 rpm e terá acoplada ao motor uma caixa de marchas Eaton de 5 velocidades. Terá 11 toneladas de PBT e carga útil de 7,164 toneladas. Ainda perde para o Mercedes-Benz Accelo 1016, com 13 toneladas de PBT se equipado com terceiro eixo. Mas o modelo da fabricante alemã é equipado com motor OM 924 LA de 4,8 litros, que desenvolve 156 cv a 2.200 rpm e torque plano de 62,2 mkgf entre 1.200 rpm e 1.600 rpm, menos eficiente portanto do que o usado pelo fabricante americano. A este motor é acoplada a caixa de marchas ZF S 5 - 180 de 5 velocidades e opcionalmente a caixa MB G 56 – 6, de 6 velocidades. No eixo traseiro MB HL2, a redução standard é 4,30:1 e opcionalmente pode receber a redução de 3,91:1. Se equipado com terceiro eixo, é obrigatória a redução de 4,30:1.

               Outro representante da categoria, o VW 9.160 vem equipado com um motor Cummins ISF, de 3,8 litros que oferta 160 cv a 2.600 rpm e 61,2 mkgf entre 1.300 rpm e 1.700 rpm. A este motor é acoplada uma caixa de marchas ZF 5 S – 420 HD e o eixo traseiro Dana 284 HD é equipado com redução standard de 4,30:1 e opcionalmente 4,63:1. Seu PBT é de 9 toneladas (ou 13 t, se equipado com 3º eixo). A VW oferece outros modelos no segmento (de 5 a 10 toneladas de PBT) com o mesmo trem de força, numa linha denominada Delivery, da qual acredito ser o 9-160 o modelo mais vendido. Aqui estão citados apenas os exemplos mais conhecidos. O que se observa nos exemplos citados (à exceção do Cargo 1119, que até esta data, sequer consta do site da Ford) é que os motores apresentam valores de potência e torque muito semelhantes. Acredito que isto seja uma demonstração do tamanho do esquecimento do segmento.

               Estão ganhando também recursos antes só encontrados em veículos de categorias bem superiores como completíssimos computadores de bordo, ar condicionado, vidros e retrovisores elétricos, por exemplo. Mas ainda carecem de outros tantos recursos como uma cabine mais espaçosa (com teto alto ou a possibilidade de leito, por exemplo), uma caixa de marchas de 6 velocidades (que diminui os intervalos entre as relações, melhora o consumo e mantém o desempenho mais constante, principalmente nas subidas, principalmente com o veículo carregado), um freio motor mais eficiente do que o tradicional de borboleta, que provoca estrangulamento do escapamento e requintes como um kit aerodinâmico que diminua a resistência aerodinâmica formada por carrocerias tipo baú.

               Do ponto de vista operacional, o veículo precisa necessariamente ter baixos custos operacional e de aquisição. São veículos destinados fundamentalmente às operações de distribuição nas cidades e regiões metropolitanas, embora não seja tão incomum viagens até bastante longas com este tipo de veículo. Seus custos (principalmente operacionais, é importante frisar) precisam ser baixos até para justificar a sua existência. Sob este ponto de vista, ele passa a não ser uma opção interessante, pois por exemplo, o motorista não terá onde passar a noite com conforto. Alguns possuem bancos inteiriços que podem se transformar numa pequena cama de solteiro. Mas oferece a limitação de o motorista dormir com a cabeça apenas do lado direito do veículo, se não quiser se sujeitar a dar uma eventual cabeçada no volante. Por tudo isso, eles não contam com cabines mais requintadas, por exemplo.  Isto faz com que o retorno do investimento seja mais rápido, ou seja, a receita que ele proporciona deve fazer com que o caminhão se pague em menos tempo. Depois, o que vier (descontadas as despesas de manutenção) é lucro.
 
Adelmo Filho
Formado em Administração de empresas
pelo Centro Universitário da Cidade
 
 

domingo, 10 de novembro de 2013

LEI DO DESCANSO


Há algum tempo tenho ouvido falar de uma lei que por enquanto, se mostrou mais controversa do que prática: A famosa Lei do Descanso é tecnicamente conhecida por Lei 12.619/2012. Explicando de forma sucinta do que se trata, é uma lei que regulamenta a carga horária dos motoristas, assim como institui a obrigatoriedade de paradas a intervalos regulares. Assim, cada quatro horas seguidas o condutor é obrigado a fazer uma parada de 30 minutos e, além disso, a cada 9 horas de trabalho mais 2 fracionadas ao longo do dia, o motorista tem direito a 11 horas de descanso. Em caso de descumprimento, a punição é pesada: A punição para o motorista que não cumprir os intervalos durante a jornada é uma multa de R$ 127,00 e cinco pontos na carteira de habilitação. Além disso, se o condutor dirigir durante mais de 24 horas seguidas, a pena é mais pesada ainda: De seis meses a  um ano de prisão.

Ocorre que a referida lei foi inspirada em legislação semelhante existente nos Estados Unidos. Foi inspirada, mas mal copiada, deixando uma série de falhas e omissões. Por exemplo, a lei daqui não previu a construção de infraestrutura adequada ao descanso dos motoristas. Na falta de tais locais, os motoristas param nos postos de combustível às margens das rodovias. Tal obrigatoriedade surgiu apenas para as novas concessões rodoviárias a serem concluídas após a entrada em vigência da Lei.

Ocorre que os donos dos postos não querem que os motoristas acabem por lotar a área dos estabelecimentos. Acabam por permitir a parada apenas daqueles que abastecem, o que se torna um jeito de ganhar mais dinheiro, mas talvez seja um filtro necessário, embora questionável. Os que não aceitam tal condição não podem parar no acostamento nem nos postos da Polícia Rodoviária Federal sob pena de multa. Em ambos os casos, o policial pode pedir o disco do tacógrafo e multar com base na lei por estar o motorista dirigindo demais, mas não porque parou no posto da PRF ou no acostamento e sim porque não encontra um local suficientemente seguro e com infraestrutura de apoio adequada. Segundo o presidente da Associação Brasileira de Caminhoneiros (Abicam), Claudinei Pelegrine, "Há postos que o interesse maior é vender combustíveis e para o motorista pernoitar é obrigado a abastecer uma certa litragem, caso contrario não permitem que o motorista fique, além disso pagar de R$ 5 a R$ 10 um banho”. O Presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado de São Paulo (Sincopetro) de Araraquara, Fernando Bicaletto contesta. Informou que desconhece a obrigatoriedade de abastecimento nos postos pelos caminhoneiros que param e taxas para banhos. Ele confirmou apenas que nos grandes postos de combustíveis são cobradas taxas de estacionamento, justificadas pelos investimentos em segurança que os proprietários fazem nestes locais.

               Passado já um considerável tempo de maturação da lei, começam a surgir suspeitas de gente que quer tirar proveito político da situação como atesta matéria cujo link encontra-se no fim do texto.

               Pretendemos aqui versar sobre possíveis vantagens e desvantagens de tal legislação. A ideia aqui é analisar as vantagens e desvantagens sob o prisma dos motoristas autônomos e empregados e sob o prisma do transportador.

               Do lado dos empresários, o que se tem verificado é um ligeiro aumento no preço do frete, notadamente de empresas que não possuem veículos com leito e um ligeiro aumento na demora da viagem. As empresas menores alegam não estar conseguindo passar integralmente para o frete os custos advindos da Lei do Descanso. As maiores talvez tenham alguma margem que as permita absorver os custos a mais de um motorista a mais, por exemplo.  As empresas que não dispõem de veículos leito se viram obrigadas a custear a hospedagem do motorista. E para mitigar o problema do atraso da viagem, surgiu nas empresas mais sofisticadas (via de regra, proprietárias de veículos com cabine leito) a figura do time, ou seja, os motoristas passaram a viajar em dupla. Aparentemente, estas se deram melhor na adaptação ao diploma legal aqui em análise.

               Do lado dos autônomos, a reclamação acerca dos atrasos das viagens é recorrente. Antes da lei, a regra era dirigir o quanto aguentasse e ficar o menor tempo possível parado. Felizmente, a maioria tinha bom senso e não dirigia cansado. Mas existe um segmento dos autônomos que anteriormente primava pela irresponsabilidade: São os chamados verdureiros. Como a carga é altamente perecível (vegetais e leguminosas), as plantações ficam, via de regra, longe dos centros de consumo, eles eram obrigados a dirigir quase que sem parar por distâncias superiores em muitos casos a 3.000 km. Então tomavam toda a sorte de anfetaminas e drogas mais pesadas na tentativa de não dormir. A lei, ao menos em teoria, os fará investir em baús refrigerados, conhecidos por câmaras frias. Talvez isto faça com que muitos deixem o segmento das verduras e os façam migrar para cargas gerais (não perecíveis), já que o investimento em câmara fria não é barato e existem os custos com combustível e com a manutenção do motor do refrigerador.

Mas parece que já tem gente querendo facilitar as coisas para as duas partes (empresários e autônomos). A CNT (Confederação Nacional do Transporte) e a Abcam, por exemplo, sugerem que as 11 horas totais possam ter redução do fracionamento das horas de descanso diário.

Em vez de nove horas ininterruptas e mais duas fracionadas ao longo do dia, a iniciativa pretende que o intervalo de repouso fracionado seja de oito horas mais três. Além disso, a proposta prevê que as 11 horas, no total diário, possam ser reduzidas em até três horas, mediante acordo coletivo ou contrato de trabalho. E Se houver espera, tanto para embarque quanto para desembarque, de duas horas ou mais, a ideia é que esse tempo seja contabilizado como descanso. A condição para tanto é que seja em caminhão leito. Outras alterações são que o tempo de descanso de 30 minutos seja a cada seis horas de direção (a lei obriga meia hora de descanso a cada quatro horas) e que os períodos de descanso e direção possam ser fracionados.

A Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística) sugere ainda que se estabeleça a igualdade de tratamento entre motorista empregado e transportador autônomo, flexibilizar o descanso diário do motorista em oito horas contínuas, mais três horas durante o mesmo dia (assim como defendem a Abcam e a Fecamsp), permitir ao motorista empregado trabalhar quatro horas extraordinárias em um mesmo dia, definir o descanso semanal permitindo sua acumulação por três semanas, permitir ao motorista pequenas movimentações durante o tempo de espera, possibilitar ao motorista em dupla o descanso no próprio veículo e o descanso com veículo parado por seis horas a cada três dias. Além disso, a Associação sugere o cadastramento dos postos de combustíveis das rodovias de todo o país em 180 dias e a vigência da lei após esse prazo, a fiscalização educativa nos primeiros 180 dias de vigência da lei e uma regra de transição para os trechos de rodovia em que não existam pontos de parada a cada 150 km, permitindo a direção até chegar ao ponto existente ou outro local de descanso. A conferir se as sugestões foram acatadas pelos legisladores.

Enfim, o assunto é polêmico e não adianta radicalizar. Na modesta opinião deste autor, a lei é boa, mas carece de aperfeiçoamentos, sempre bem vindos. De parte a parte, cabe muito estudo, tato e negociação. Aos motoristas e empresários cabe cumprir a lei. Ao poder público cabe fiscalizar o devido cumprimento da mesma e corrigir quaisquer desvios de conduta. Ao poder público cabe também a correção tempestiva de quaisquer enventuais incoerências que porventura possam existir.

 







 Adelmo Filho
Formado em Administração de empresas
pelo Centro Universitário da Cidade



 

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

LOGÍSTICA – UM PROCESSO MUITAS VEZES NEGLIGENCIADO


 

O que pensar de uma cadeia logística que devia fazer os produtos chegarem aos consumidores finais com rapidez e baixo custo e faz exatamente o contrário?

Aprendi na faculdade que na teoria, tudo funciona com rapidez, presteza, uso massivo de tecnologia e baixo custo. Esta é a teoria. A prática é exatamente a oposta. A carência de infraestrutura e planejamento é tal que provoca perdas desnecessárias de tempo entre as etapas do processo e gera toda a sorte de prejuízos.

No mundo perfeito da academia, um caminhão encosta numa doca, é descarregado, a nota fiscal é adequadamente conferida, a carga é desmembrada, fazem-se outros lotes com outros itens que já se encontram à disposição, pois foram trazidos por outros caminhões; são confeccionadas novas notas fiscais e estes novos lotes menores são colocados em veículos menores, através dos quais será feita a distribuição nos centros urbanos. Resumidamente, o processo é este. Todo este processo ocorre em um tempo que tende a ser bastante curto, que eu estimo em uma hora por absoluta falta de metodologia científica que me permita determinar um tempo ideal com um grau de certeza aceitável. Na prática, tenho relatos de que a descarga ocorre em uma semana, a conferência da nota e da carga despende outro tanto de tempo, assim como a descarga propriamente dita, outra semana se passa até que se saiba da existência de outra carga e o destino da mesma, outros tantos dias se perdem até a tal carga ser acomodada no caminhão, mais seis dias se passam até a nota fiscal ficar pronta (enquanto isso, o caminhão serve de storage e tem os componentes da suspensão e os pneus desgastados desnecessariamente). E finalmente o pobre do motorista consegue partir depois de uma tremenda via crucis que pode durar 20 dias ou mais. Como vemos, a viagem é quase sempre a parte rápida e eficiente do processo, por mais longa que seja.

Se o veículo for de transportadora, este prejuízo (financeiro e temporal) já está embutido no preço do frete. Mas e quando o caminhão é do autônomo, que muitas vezes compra o veículo financiado a perder de vista e tem que arcar com pesadas prestações, combustível, manutenção, impostos e taxas de todo tipo e se conseguir, ainda tirar algum lucro? Quem arca com o prejuízo de tanto tempo parado? Quem arca com o desgaste das molas, amortecedores e pneus, que mesmo com o veículo parado, sofrem desgaste acentuado e desnecessário? Este profissional quase nunca consegue barganhar o melhor frete e a melhor carga. O que ele consegue, via de regra é pegar uma carga. Boa ou ruim, dê-se por satisfeito.

Aprendi na faculdade (e espero ter aprendido certo) que caminhão parado é prejuízo certo. Quanta carga este veículo deixou de transportar? Que retorno financeiro (que pode ser traduzido por lucro) o veículo deixou de dar? Será que na outra ponta não há ninguém esperando por uma mercadoria que pode num limite extremo, parar uma linha de montagem? De que adianta um veículo potente, capaz de desenvolver excelentes médias horárias (alguns são quase capazes de transformar subidas em planos, com perda mínima de velocidade), modernos, econômicos e (porque não) bonitos se toda essa produtividade é perdida num centro de distribuição ou na doca de uma empresa com processo logístico menos eficiente? Eu acredito que tamanho descaso só terá fim se o motorista (neste caso, o autônomo) for remunerado pela hora parada e não apenas pelo quilômetro percorrido.

Chegam-me também muitos relatos de fretes baixos. Há quem receba em média R$ 2,30 por km e que com tal preço, sequer é possível custear o combustível, que dirá remunerar o investimento realizado na aquisição do veículo e arcar com as prestações e manutenção do mesmo. Começamos então a entender porque a idade média da frota dos autônomos é tão alta (estimada em 30 anos, quando a das empresas é estimada em 2 anos nas maiores) e o frete precisa necessariamente ser caro. Por serem veículos de idade média elevada, a manutenção é mais frequente, mais pesada e mais cara. E muitos proprietários mal dão conta de manter os seus veículos em condições de trafegabilidade e segurança.

Mas a questão do frete baixo talvez se resolva com certa facilidade. É só repassar o aumento para o consumidor final. Mas quem está no meio da cadeia (o atacadista e os intermediários que proliferam como pragas) vão querer arcar com este custo a mais? E qual será o impacto na inflação deste custo a mais? Colocamos em cena então o Governo Federal, que promete toda a sorte de obras de infraestrutura (de longo tempo de realização e maturação, é verdade) e não faz tais obras saírem do papel. São obras que não deveriam se resumir a um mandato, e sim a uma década, com dois ou três governantes sucessivos trabalhando diuturnamente na execução de tais obras tidas como vitais para a logística do Brasil.

Claro que uma empresa com um processo logístico minimamente organizado fez o planejamento de estoque considerando tais variáveis (e tantas outras mais, até de ordem meteorológica). Algumas chegam ao requinte de colocar até um engarrafamento inesperado no planejamento e ter mais de um trajeto definido para mitigar tais eventualidades que causam atraso e transtorno e conseguem dimensionar um estoque de segurança capaz de suportar tais eventualidades. Assim, conseguem dimensionar um tamanho de LEC (Lote Econômico de Compras) e um estoque de segurança adequado, principalmente nos chamados materiais Classe A (normalmente itens caros e fundamentais no processo produtivo, seja ele qual for).

Mas voltando ao motorista que passou quase um mês longe de casa, como será que ele se sente num centro de distribuição ou numa empresa sem infraestrutura que compreenda um refeitório, um lugar adequado para a higiene pessoal ou uma área de lazer para ocupar tanto tempo ocioso? Creio ser consenso que a classe dos motoristas rodoviários é desvalorizada e merece um pouco mais de respeito. Mas a desvalorização e o desrespeito começam nas empresas com seus processos internos ineficientes, mal planejados, pouco profissionais e muitas vezes, com custos mais elevados do que o necessário.

Mas tal atitude de desrespeito com o profissional e o amadorismo nos controles dos processos logísticos são coisas que não se mudam da noite para o dia. Antes da mudança propriamente dita, há que se mudar a mentalidade dos envolvidos e a empresa precisa passar por um processo profundo (e muitas vezes traumático) de mudança de cultura organizacional que pode levar um tempo considerável. Mas é um processo que uma vez iniciado, não pode ser interrompido e talvez jamais seja concluído. Exige que todos os envolvidos se conscientizem de que algo precisa ser feito.  Caso contrário, os concorrentes (que possuem processos mais enxutos e ágeis, que se traduzem em custos menores até para os clientes) tomarão a fatia de mercado da empresa em questão e, no limite extremo, esta empresa pode até entrar em sérias dificuldades financeiras.
 
Adelmo Filho
Formado em Administração de empresas
pelo Centro Universitário da Cidade