quinta-feira, 31 de outubro de 2013

LOGÍSTICA – UM PROCESSO MUITAS VEZES NEGLIGENCIADO


 

O que pensar de uma cadeia logística que devia fazer os produtos chegarem aos consumidores finais com rapidez e baixo custo e faz exatamente o contrário?

Aprendi na faculdade que na teoria, tudo funciona com rapidez, presteza, uso massivo de tecnologia e baixo custo. Esta é a teoria. A prática é exatamente a oposta. A carência de infraestrutura e planejamento é tal que provoca perdas desnecessárias de tempo entre as etapas do processo e gera toda a sorte de prejuízos.

No mundo perfeito da academia, um caminhão encosta numa doca, é descarregado, a nota fiscal é adequadamente conferida, a carga é desmembrada, fazem-se outros lotes com outros itens que já se encontram à disposição, pois foram trazidos por outros caminhões; são confeccionadas novas notas fiscais e estes novos lotes menores são colocados em veículos menores, através dos quais será feita a distribuição nos centros urbanos. Resumidamente, o processo é este. Todo este processo ocorre em um tempo que tende a ser bastante curto, que eu estimo em uma hora por absoluta falta de metodologia científica que me permita determinar um tempo ideal com um grau de certeza aceitável. Na prática, tenho relatos de que a descarga ocorre em uma semana, a conferência da nota e da carga despende outro tanto de tempo, assim como a descarga propriamente dita, outra semana se passa até que se saiba da existência de outra carga e o destino da mesma, outros tantos dias se perdem até a tal carga ser acomodada no caminhão, mais seis dias se passam até a nota fiscal ficar pronta (enquanto isso, o caminhão serve de storage e tem os componentes da suspensão e os pneus desgastados desnecessariamente). E finalmente o pobre do motorista consegue partir depois de uma tremenda via crucis que pode durar 20 dias ou mais. Como vemos, a viagem é quase sempre a parte rápida e eficiente do processo, por mais longa que seja.

Se o veículo for de transportadora, este prejuízo (financeiro e temporal) já está embutido no preço do frete. Mas e quando o caminhão é do autônomo, que muitas vezes compra o veículo financiado a perder de vista e tem que arcar com pesadas prestações, combustível, manutenção, impostos e taxas de todo tipo e se conseguir, ainda tirar algum lucro? Quem arca com o prejuízo de tanto tempo parado? Quem arca com o desgaste das molas, amortecedores e pneus, que mesmo com o veículo parado, sofrem desgaste acentuado e desnecessário? Este profissional quase nunca consegue barganhar o melhor frete e a melhor carga. O que ele consegue, via de regra é pegar uma carga. Boa ou ruim, dê-se por satisfeito.

Aprendi na faculdade (e espero ter aprendido certo) que caminhão parado é prejuízo certo. Quanta carga este veículo deixou de transportar? Que retorno financeiro (que pode ser traduzido por lucro) o veículo deixou de dar? Será que na outra ponta não há ninguém esperando por uma mercadoria que pode num limite extremo, parar uma linha de montagem? De que adianta um veículo potente, capaz de desenvolver excelentes médias horárias (alguns são quase capazes de transformar subidas em planos, com perda mínima de velocidade), modernos, econômicos e (porque não) bonitos se toda essa produtividade é perdida num centro de distribuição ou na doca de uma empresa com processo logístico menos eficiente? Eu acredito que tamanho descaso só terá fim se o motorista (neste caso, o autônomo) for remunerado pela hora parada e não apenas pelo quilômetro percorrido.

Chegam-me também muitos relatos de fretes baixos. Há quem receba em média R$ 2,30 por km e que com tal preço, sequer é possível custear o combustível, que dirá remunerar o investimento realizado na aquisição do veículo e arcar com as prestações e manutenção do mesmo. Começamos então a entender porque a idade média da frota dos autônomos é tão alta (estimada em 30 anos, quando a das empresas é estimada em 2 anos nas maiores) e o frete precisa necessariamente ser caro. Por serem veículos de idade média elevada, a manutenção é mais frequente, mais pesada e mais cara. E muitos proprietários mal dão conta de manter os seus veículos em condições de trafegabilidade e segurança.

Mas a questão do frete baixo talvez se resolva com certa facilidade. É só repassar o aumento para o consumidor final. Mas quem está no meio da cadeia (o atacadista e os intermediários que proliferam como pragas) vão querer arcar com este custo a mais? E qual será o impacto na inflação deste custo a mais? Colocamos em cena então o Governo Federal, que promete toda a sorte de obras de infraestrutura (de longo tempo de realização e maturação, é verdade) e não faz tais obras saírem do papel. São obras que não deveriam se resumir a um mandato, e sim a uma década, com dois ou três governantes sucessivos trabalhando diuturnamente na execução de tais obras tidas como vitais para a logística do Brasil.

Claro que uma empresa com um processo logístico minimamente organizado fez o planejamento de estoque considerando tais variáveis (e tantas outras mais, até de ordem meteorológica). Algumas chegam ao requinte de colocar até um engarrafamento inesperado no planejamento e ter mais de um trajeto definido para mitigar tais eventualidades que causam atraso e transtorno e conseguem dimensionar um estoque de segurança capaz de suportar tais eventualidades. Assim, conseguem dimensionar um tamanho de LEC (Lote Econômico de Compras) e um estoque de segurança adequado, principalmente nos chamados materiais Classe A (normalmente itens caros e fundamentais no processo produtivo, seja ele qual for).

Mas voltando ao motorista que passou quase um mês longe de casa, como será que ele se sente num centro de distribuição ou numa empresa sem infraestrutura que compreenda um refeitório, um lugar adequado para a higiene pessoal ou uma área de lazer para ocupar tanto tempo ocioso? Creio ser consenso que a classe dos motoristas rodoviários é desvalorizada e merece um pouco mais de respeito. Mas a desvalorização e o desrespeito começam nas empresas com seus processos internos ineficientes, mal planejados, pouco profissionais e muitas vezes, com custos mais elevados do que o necessário.

Mas tal atitude de desrespeito com o profissional e o amadorismo nos controles dos processos logísticos são coisas que não se mudam da noite para o dia. Antes da mudança propriamente dita, há que se mudar a mentalidade dos envolvidos e a empresa precisa passar por um processo profundo (e muitas vezes traumático) de mudança de cultura organizacional que pode levar um tempo considerável. Mas é um processo que uma vez iniciado, não pode ser interrompido e talvez jamais seja concluído. Exige que todos os envolvidos se conscientizem de que algo precisa ser feito.  Caso contrário, os concorrentes (que possuem processos mais enxutos e ágeis, que se traduzem em custos menores até para os clientes) tomarão a fatia de mercado da empresa em questão e, no limite extremo, esta empresa pode até entrar em sérias dificuldades financeiras.
 
Adelmo Filho
Formado em Administração de empresas
pelo Centro Universitário da Cidade
 


8 comentários:

  1. Parabéns Sr. Adelmo Filho, que seus conhecimentos venham agregar um futuro melhor para o sistema da logística e transporte do mundo, abraço, Marcelo Apparatus.

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  2. Obrigado, meu caro Marcelo Luis Winsecki! rs

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  3. Vamos falar a verdade, e mostrar o que está errado por escusos motivos. Este é o caminho.

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  4. Infelizmente essa profissão está denegrindo consideravelmente a cada dia que se passa!

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