Há algum tempo
tenho ouvido falar de uma lei que por enquanto, se mostrou mais controversa do
que prática: A famosa Lei do Descanso é tecnicamente conhecida por Lei
12.619/2012. Explicando de forma sucinta do que se trata, é uma lei que
regulamenta a carga horária dos motoristas, assim como institui a
obrigatoriedade de paradas a intervalos regulares. Assim, cada quatro horas
seguidas o condutor é obrigado a fazer uma parada de 30 minutos e, além disso,
a cada 9 horas de trabalho mais 2 fracionadas ao longo do dia, o motorista tem
direito a 11 horas de descanso. Em caso de descumprimento, a punição é pesada:
A punição para o motorista que não cumprir os intervalos durante a jornada é
uma multa de R$ 127,00 e cinco pontos na carteira de habilitação. Além disso,
se o condutor dirigir durante mais de 24 horas seguidas, a pena é mais pesada ainda:
De seis meses a um ano de prisão.
Ocorre que a
referida lei foi inspirada em legislação semelhante existente nos Estados
Unidos. Foi inspirada, mas mal copiada, deixando uma série de falhas e
omissões. Por exemplo, a lei daqui não previu a construção de infraestrutura
adequada ao descanso dos motoristas. Na falta de tais locais, os motoristas
param nos postos de combustível às margens das rodovias. Tal obrigatoriedade
surgiu apenas para as novas concessões rodoviárias a serem concluídas após a
entrada em vigência da Lei.
Ocorre que os
donos dos postos não querem que os motoristas acabem por lotar a área dos
estabelecimentos. Acabam por permitir a parada apenas daqueles que abastecem, o
que se torna um jeito de ganhar mais dinheiro, mas talvez seja um filtro
necessário, embora questionável. Os que não aceitam tal condição não podem
parar no acostamento nem nos postos da Polícia Rodoviária Federal sob pena de
multa. Em ambos os casos, o policial pode pedir o disco do tacógrafo e multar
com base na lei por estar o motorista dirigindo demais, mas não porque parou no
posto da PRF ou no acostamento e sim porque não encontra um local
suficientemente seguro e com infraestrutura de apoio adequada. Segundo o
presidente da Associação Brasileira de Caminhoneiros (Abicam), Claudinei
Pelegrine, "Há postos que o interesse maior é vender combustíveis e para o
motorista pernoitar é obrigado a abastecer uma certa litragem, caso contrario
não permitem que o motorista fique, além disso pagar de R$ 5 a R$ 10 um banho”.
O Presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do
Estado de São Paulo (Sincopetro) de Araraquara, Fernando Bicaletto contesta.
Informou que desconhece a obrigatoriedade de abastecimento nos postos pelos
caminhoneiros que param e taxas para banhos. Ele confirmou apenas que nos
grandes postos de combustíveis são cobradas taxas de estacionamento,
justificadas pelos investimentos em segurança que os proprietários fazem nestes
locais.
Passado
já um considerável tempo de maturação da lei, começam a surgir suspeitas de
gente que quer tirar proveito político da situação como atesta matéria cujo
link encontra-se no fim do texto.
Pretendemos
aqui versar sobre possíveis vantagens e desvantagens de tal legislação. A ideia
aqui é analisar as vantagens e desvantagens sob o prisma dos motoristas
autônomos e empregados e sob o prisma do transportador.
Do
lado dos empresários, o que se tem verificado é um ligeiro aumento no preço do
frete, notadamente de empresas que não possuem veículos com leito e um ligeiro
aumento na demora da viagem. As empresas menores alegam não estar conseguindo
passar integralmente para o frete os custos advindos da Lei do Descanso. As
maiores talvez tenham alguma margem que as permita absorver os custos a mais de
um motorista a mais, por exemplo. As
empresas que não dispõem de veículos leito se viram obrigadas a custear a hospedagem
do motorista. E para mitigar o problema do atraso da viagem, surgiu nas
empresas mais sofisticadas (via de regra, proprietárias de veículos com cabine
leito) a figura do time, ou seja, os motoristas passaram a viajar em dupla.
Aparentemente, estas se deram melhor na adaptação ao diploma legal aqui em
análise.
Do
lado dos autônomos, a reclamação acerca dos atrasos das viagens é recorrente.
Antes da lei, a regra era dirigir o quanto aguentasse e ficar o menor tempo
possível parado. Felizmente, a maioria tinha bom senso e não dirigia cansado.
Mas existe um segmento dos autônomos que anteriormente primava pela
irresponsabilidade: São os chamados verdureiros. Como a carga é altamente
perecível (vegetais e leguminosas), as plantações ficam, via de regra, longe
dos centros de consumo, eles eram obrigados a dirigir quase que sem parar por
distâncias superiores em muitos casos a 3.000 km. Então tomavam toda a sorte de
anfetaminas e drogas mais pesadas na tentativa de não dormir. A lei, ao menos
em teoria, os fará investir em baús refrigerados, conhecidos por câmaras frias.
Talvez isto faça com que muitos deixem o segmento das verduras e os façam
migrar para cargas gerais (não perecíveis), já que o investimento em câmara
fria não é barato e existem os custos com combustível e com a manutenção do
motor do refrigerador.
Mas parece que
já tem gente querendo facilitar as coisas para as duas partes (empresários e
autônomos). A CNT (Confederação Nacional do Transporte) e a Abcam, por exemplo,
sugerem que as 11 horas totais possam ter redução do fracionamento das horas de
descanso diário.
Em vez de nove
horas ininterruptas e mais duas fracionadas ao longo do dia, a iniciativa
pretende que o intervalo de repouso fracionado seja de oito horas mais três.
Além disso, a proposta prevê que as 11 horas, no total diário, possam ser
reduzidas em até três horas, mediante acordo coletivo ou contrato de trabalho.
E Se houver espera, tanto para embarque quanto para desembarque, de duas horas
ou mais, a ideia é que esse tempo seja contabilizado como descanso. A condição
para tanto é que seja em caminhão leito. Outras alterações são que o tempo
de descanso de 30 minutos seja a cada seis horas de direção (a lei obriga meia
hora de descanso a cada quatro horas) e que os períodos de descanso e direção
possam ser fracionados.
A Associação
Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística) sugere ainda
que se estabeleça a igualdade de tratamento entre motorista empregado e
transportador autônomo, flexibilizar o descanso diário do motorista em oito
horas contínuas, mais três horas durante o mesmo dia (assim como defendem a
Abcam e a Fecamsp), permitir ao motorista empregado trabalhar quatro horas
extraordinárias em um mesmo dia, definir o descanso semanal permitindo sua
acumulação por três semanas, permitir ao motorista pequenas movimentações
durante o tempo de espera, possibilitar ao motorista em dupla o descanso no
próprio veículo e o descanso com veículo parado por seis horas a cada três
dias. Além disso, a Associação sugere o cadastramento dos postos de
combustíveis das rodovias de todo o país em 180 dias e a vigência da lei após
esse prazo, a fiscalização educativa nos primeiros 180 dias de vigência da lei
e uma regra de transição para os trechos de rodovia em que não existam pontos
de parada a cada 150 km, permitindo a direção até chegar ao ponto existente ou
outro local de descanso. A conferir se as sugestões foram acatadas pelos
legisladores.
Enfim, o
assunto é polêmico e não adianta radicalizar. Na modesta opinião deste autor, a
lei é boa, mas carece de aperfeiçoamentos, sempre bem vindos. De parte a parte,
cabe muito estudo, tato e negociação. Aos motoristas e empresários cabe cumprir
a lei. Ao poder público cabe fiscalizar o devido cumprimento da mesma e
corrigir quaisquer desvios de conduta. Ao poder público cabe também a correção
tempestiva de quaisquer enventuais incoerências que porventura possam existir.
Adelmo Filho
Formado em Administração de empresas
pelo Centro Universitário da Cidade